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Doença de Gaucher.

As manifestações clínicas da doença foram diagnosticadas pela primeira vez em 1882, pelo médico francês Philippe Charles Ernest Gaucher, numa mulher de 32 anos com fígado e baço aumentados. Os sintomas mais comuns são: fadiga (devido à anemia), sangramentos, principalmente de nariz (por causa da redução do número de plaquetas), dores nos ossos, fraturas espontâneas (provocadas pelas anormalidades ósseas), cirrose, fibrose, varizes de esôfago e desconforto abdominal (devido ao tamanho aumentado do fígado e/ou do baço.
                                     
Esses sintomas referem-se em particular ao tipo 1 da doença, cujo curso clínico é muito variável, indo de leve a grave. Há pessoas que não desenvolvem sintomas clínicos. Os pacientes podem nascer com a doença manifesta ou permanecer assintomáticos até serem diagnosticados, de forma inesperada às vezes, na idade adulta. A maior parte dos pacientes apresenta algumas manifestações clínicas e não todas ao mesmo tempo.
A Doença de Gaucher é uma doença genética, progressiva, e a mais comum das doenças lisossômicas de depósito, que recebem esse nome devido ao acúmulo de restos de células envelhecidas depositadas nos lisossomos (pequenas estruturas celulares que contêm enzimas essenciais ao equilíbrio do organismo). Essas doenças fazem parte de um conjunto de mais de 40 enfermidades genéticas que têm como característica a deficiência de uma ou mais enzimas.
A enzima que falta nas pessoas com Doença de Gaucher é a ß-glicosidase ácida, ou glicocerebrosidase. Sua função habitual, nas pessoas sem a doença, é fazer a “digestão” de um substrato lipídico (tipo de gordura), o glicocerebrosídeo, dentro da célula. Por causa da alteração no gene que produz a enzima, seu nível é insuficiente e ela não consegue, com a rapidez necessária, decompor o substrato, que então se acumula nos lisossomos.
Os lisossomos situam-se no interior dos macrófagos, que funcionam como células “lixeiras” do organismo, responsáveis pela “limpeza” dos restos de células velhas. Devido ao acúmulo do substrato lipídico, os macrófagos são impedidos de realizar suas funções. Ficam pesados, “gordos”, cheios de glicocerebrosídeo não digerido – como ficaria alguém que não digerisse os alimentos após uma refeição – e passam a ser chamados de células de Gaucher.

As manifestações clínicas ou fenotípicas da DG vão depender do grau de deficiência da beta-glicosidase ácida e do acúmulo dos glicolipídios, que são variáveis. Existem três fenótipos descritos da DG:
♦ Tipo 1 (forma não neuropática): Afeta crianças e adultos, a idade de início dos sinais e sintomas é muito variável. A apresentação clínica típica é hepatomegalia, esplenomegalia levando a hiperesplenismo com progressiva anemia, trombocitopenia e leucopenia. O quadro é ainda associado à fadiga, cansaço, plenitude gástrica pós-prandial e retardo de crescimento em crianças. O acúmulo de glicocerebrosídeo na medula óssea leva à osteopenia, lesões líticas, fraturas patológicas, dor óssea crônica, crises ósseas, infarto e osteonecrose. É descrito também uma maior incidência de tumores ósseos nos pacientes com DG. O tipo I é o mais frequente, correspondendo a 95 % dos casos de DG.
♦ Tipo 2 (forma neuropática aguda): Afeta lactentes com 4-5 meses de idade, compromete cérebro, baço, fígado e pulmão. O quadro neurológico é grave, com múltiplas convulsões, hipertonia, apnéia e progressivo retardo mental. A evolução é rápida, com morte nos primeiros dois anos de vida, em geral pelo envolvimento pulmonar. 
♦ Tipo 3 (forma neuropática crônica): Afeta crianças e adolescentes, a idade de início é variável, mas em geral no pré-escolar. Compromete cérebro, baço, fígado e ossos. A evolução do quadro neurológico é variável, mas menos grave que o do tipo II. A sobrevida se dá até a segunda ou terceira década de vida. 




O diagnóstico normalmente é confirmado através de exame de sangue com medição da dosagem da enzima beta-glicosidase nos glóbulos brancos; também pode ser feito com o exame de fibroblastos, escolhidos através de um fragmento da pele do baço; Quando houver incerteza do diagnóstico, pode ser feita uma biópsia da medula óssea para identificar as células de Gaucher.
 A Doença de Gaucher é transmitida de pais para filhos. Trata-se de um erro inato do metabolismo, em que o gene defeituoso pode ser herdado por filhos de ambos os sexos, com chance de recorrência de 25% para os irmãos do paciente afetado.A doença é autossômica recessiva, ou seja: autossômica porque o defeito genético situa-se num dos pares de cromossomos autossômicos, e recessiva porque é preciso, para desenvolvê-la, herdar duas cópias defeituosas do gene, uma do pai e outra da mãe.
Se a pessoa herdar apenas um gene defeituoso (ou do pai ou da mãe), ela se torna portadora assintomática da doença, não desenvolvendo nenhum dos sintomas. Neste caso, é possível passar a vida inteira sem tomar conhecimento das consequências da mutação genética. Contudo, o portador assintomático pode transmitir a doença se tiver filhos com outra pessoa que também carrega o gene defeituoso.

O tratamento específico da Doença de Gaucher é realizado com eficácia e segurança pela Terapia de Redução do Substrato (TRS), por via oral, ou pela Terapia de Reposição Enzimática (TRE), por infusão intravenosa.
Os tratamentos diminuem o volume do fígado e do baço, corrigem o decréscimo dos glóbulos brancos, glóbulos vermelhos e plaquetas do sangue (pancitopenia) e controlam as alterações ósseas, inclusive a dor. Em consequência da ampla distribuição pelos tecidos, a TRS também atua bem nas manifestações clínicas nos ossos, órgãos que não são tão bem atingidos pela reposição de enzimas.
Critérios de inclusão para o protocolo de tratamento com reposição enzimática:
1. Diagnóstico confirmado de doença de Gaucher, pela dosagem da atividade enzimática da beta-glicosidadese ácida em leucócitos.
2. Portador de doença de Gaucher do tipo I ou III. Nos pacientes do tipo III, o tratamento deve ser introduzido precocemente, antes de quadro neurológico grave estar estabelecido.
à Além dos critérios 1 e 2 descritos acima, deve estar presente pelo menos uma das situações abaixo:
♦ Apresentar evidências clínicas de comprometimento hepático ou esplênico ou esplenectomia prévia;
♦ Apresentar anemia com hemoglobina abaixo de 2 g/dl dos níveis previstos para sexo e idade;
♦ Apresentar plaquetas abaixo de 100.000 /mm3;
♦ Apresentar evidência radiológica de doença óssea (osteopenia, deformidade em frasco Erlenmeyer, osteoartrose, osteoesclerose, osteoporose, fratura patológica, necrose asséptica);
♦ Apresentar dor óssea ou crises ósseas;
♦ Apresentar retardo de crescimento definido como: crianças com estatura abaixo do percentil 3, abaixo do esperado para o potencial genético da média das alturas dos pais, ou decréscimo na velocidade de crescimento;
♦Apresentar sintomas como dor abdominal, fadiga, fraqueza ou caquexia e comprometimento da qualidade de vida;
♦ Comprometimento de outros órgãos (coração, rins e pulmão);
♦ História de irmão/irmã com doença de Gaucher tipo III com presença de genótipo idêntico.


Referências
Disponível em: <http://doencadegaucher.com.br/como-e-tratada-a-doenca-de-gaucher/> Acesso em: 22/06

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